Mudança dos Ventos

A Volta de Gabriel parecia ter dado um upgrade no meu ânimo. Eu me sentia pronto para encarar Deus ou o Diabo. O que viesse primeiro. Consegui aguardar com paciência a ligação de Aretha.

Mas ela não ligou. Apenas surgiu na porta, para minha surpresa.
– Ficou louca? O que deu em você?
De qualquer forma eu estava muito feliz em vê-la.
– Ah, J! Não briga comigo! Eu estou com tanta saudade! E não vou poder demorar...

Ela se pendurou no meu pescoço, da forma como adorava fazer.
– Não brigo, Anjo... Mas não precisava fazer isso.
– Eu não fiz nada. Apenas fui dar uma satisfação. Eu devia isso ao Gabe também.

– Sabe que não devia nada! O que exatamente disse a ele?
– Exatamente? A verdade.

– Aretha...
– Pra que isso, Jack? Ele já não falou com você? Não está tudo resolvido? É isso que importa.

– Ele disse que te tratou mal...
– Ele é exagerado... Ei, escuta... Eu não poderia nunca, ficar entre você e ele, me entende? Ser o motivo de um afastamento entre os dois. Nunca!

Eu a calei. Estava sedento por um beijo seu há dias. Fui com tanta vontade que minha força a empurrou para trás.

– Ótima maneira de encerrar uma discussão... – Ela disse após respirar. – Quero outro... Por favor...

Impossível negar um pedido assim. Puxei Aretha para mim e a beijei mais uma vez.

– Mas você tinha dito que me daria um relatório detalhado. – Eu a lembrei.
– Eu troco... Escolha, e eu pago uma prenda.

– Qualquer uma?
– Seja bonzinho...

– Serei mas me dê um tempo pra pensar...
– A prenda é sua... Você que sabe!

– Então você conheceu a Eduarda? – Não resisti e provoquei. Tão saudoso quanto estava de seus beijos, estava de sua careta. Mas ela pareceu não se abalar.
– Verdade... Conheci. Eu estava “beeeeem” errada!

– Eu queria ter visto sua expressão. – Sorri.
– Não fiz expressão nenhuma! – Pronto! Lá estava ele! O Nariz franzido sob as sardas!

– Como não está fazendo agora, Anjo! – Impliquei.
– Jack! Você é... Insuportável!

– E você mudou o cabelo de novo... – Disse enquanto passeava por ele com minha mão. Eu nunca conseguiria me concentrar em nada ao seu lado, conseguiria?
– E você é o único homem que eu conheço que consegue ver a diferença. Eu cortei e fiz um aplique.

– Está lindo. – Eu a abracei. – Vamos, se você não pode ficar, eu te levo pra casa...
– Posso pegar um taxi, J. – Ela disse sem jeito. – Eu ainda estou na casa dos meus pais... Achei melhor ficar lá até o fim das férias.

– Acho justo que fique, Aretha, se sente melhor, mas acontece que o nosso “romance” não é mais particular, e a menos que você não queira, eu não estou mais me incomodando com o que ninguém pensa. Seus pais sabem como eu me sinto. – Bom, pelo menos a mãe dela sabia.
Os olhos negros de Aretha brilharam.
– Ah, J! Eu te amo tanto! Vou adorar sua carona...

Acomodei Aretha no conversível. Se era pra encarar, que fosse com estilo. Mas antes de tirar o carro da garagem, dei-lhe um último beijo. Podia ser que não tivesse outra oportunidade esta noite.

Dito e feito. Como um cão farejador, lá estava Mark, plantado na sacada da varanda da entrada de sua casa, aguardando sua cria que – ele não tinha nenhuma dúvida –, havia ido visitar o cafajeste do namorado.

Eu ainda tinha amor à minha vida. E à filha dele.
– Boa noite, Anjo... Durma bem.

Mark esperava pacientemente. Sem berrar, sem espernear nem bufar, mas um sorriso seria pedir muito.

Aretha também soube se comportar. Tão linda... Tão inteligente.
– Boa noite, J. – E com a certeza de que seu pai não podia ouvir, completou baixinho. – A gente se vê amanhã.