sábado, 15 de janeiro de 2011

Epílogo

Olhando para trás, posso me dizer um homem orgulhoso de minha família e, porque não assumir, de mim mesmo.


Meus velhos amigos, pouco mudaram. Uma ruga ou fio de cabelo branco a mais, sem maiores danos. A vida estava sendo generosa com todos nós.


Ana continuava a encantar a todos com suas atuações impecáveis nos cinemas, mas cancelou contratos com outros trabalhos. Seu rosto continuava na mídia, embora com muito menos frequência. Ela preferiu dedicar grande parte de seu tempo a seu casamento. Sorte de Alessandro.


A família nova que eu havia ganhado era divertida afinal, contrariando tudo que eu sempre julguei ser. E devo admitir que até mesmo Mark, tinha algum senso de humor.


Ele e Tara eram avós zelosos e dedicados e, assim como eu, tinham tempo de sobra. Sempre que podiam, me roubavam Aimeé. Não posso culpá-los, pois para mim, era quase impossível conseguir me desgrudar da pequenininha.


Thales terminou o curso de Artes Plásticas com a sorte de ter Eve Wells como Patronesse de sua turma. Eve gostava de investir em novos talentos, e apostou firme em meu cunhado, que correspondeu além de suas expectativas, tendo seu trabalho recebido elogios de curadores e colecionadores renomados internacionalmente.


Alanis, que havia se formado no ano anterior em Biologia, estava agora fazendo uma pós-graduação em Ecologia e Preservação Ambiental. Ela e Thales já haviam ficado noivos, como sinal de compromisso, mas não haviam marcado datas.


Sempre que perguntávamos o motivo, Thales brincava: “Sem pressão! Sem pressão!” Mas no fundo sabíamos que ele era o mais ansioso. Foi Alanis quem pediu que esperassem ela terminar o curso e começar a trabalhar.


Gabriel continuava suas andanças pelo mundo, sempre acompanhando Parnila. Ele e a médica estavam juntos agora. Ele contou que foi ela quem tomou a iniciativa, diante de sua indecisão. Ele a achava “muita areia pro seu caminhão”.


“Tinha medo que ela achasse petulância da minha parte e não me quisesse mais ao seu lado. Eu não suportaria. Um dia ela simplesmente entrou no meu dormitório, decidida. Eu nunca a tinha visto com os cabelos soltos e sem os óculos.”


Pelo visto, Gabriel tinha se achado de diversas formas: o porquê de sua música, sua vocação em se doar, seu dom para promover o bem, mas parecia que sempre precisava de uma “mãozinha” quando se tratava de seu próprio coração. Menos mal que a médica soube o que fazer.


Júlia era uma mulher multi-tarefas. Sempre foi, desde quando cuidava de mim, da casa e de Ana. E agora, embora eu tivesse lhe dado um alívio, havia o Arthur. Mas ela não abandonou seu trabalho e Hélio continuava a frente dos negócios de seu pai.


Depois de muito conversarmos, Aretha havia retomado seu curso de engenharia na UNESim. Ela estava muito dividida quanto a isso, pois sempre gostou de estudar, mas descobriu a delícia de ser mãe e tinha muita resistência em deixar Aimée. Acabou concordando em voltar com calma, fazendo poucas matérias para se dedicar a ambos.


Não me afligia mais o “Senhor Sorriso”, mesmo que agora ele já ocupasse o cargo de professor. Não só porque sentia minha insegurança gradativamente indo embora, mas também porque eu fiquei sabendo que ele finalmente estava namorando alguém. Aparentemente uma de suas alunas.


Aimée e Arthur estavam frequentando o “maternalzinho”, por insistência de Aretha e Júlia. As duas acreditavam que eles precisavam ter uma educação orientada, aprender a dividir e ter contato com outras crianças. Mas somente meio período – e essa parte foi exigência minha –, o restante do dia eles passavam comigo.


A vantagem de ter Arthur sempre tão próximo, é que eu podia mimar Aimée da mesma forma. Isso contrariava Aretha, que dizia ser errado fazer-lhe todas as vontades. Eu sei que ela estava com a razão, mas era mais forte que eu. Os dois me faziam de gato e sapato.


Quando ela brigava comigo, eu respondia coisas do tipo: “Eu também te dava sorvete antes do almoço, quando você vinha passar o fim de semana, e você não achava nada ruim...” Ela perdia o argumento e só podia mesmo franzir o nariz.


A vida com Aretha continuava tão imprevisível quanto ela própria. Tão imprevisível como encontrar passagens para Veneza embaixo do travesseiro, ou o meu tênis novo secando no forno de microondas.


Como foi imprevisível nossa banda tocar junta novamente. Mas aconteceu: a produtora nos convocou para fazer um show comemorativo dos 25 anos de sucesso dos Hell’s Messengers.


Então eu pude desfrutar de várias sensações. A tensão divertida dos ensaios para que tudo saísse perfeito, as lembranças dos bons tempos de viagens e turnês. A concentração no camarim e o frio na barriga antes de entrar no palco.


Mas dessa vez havia uma sensação nova e maravilhosa. Dessa vez eu entrava motivado como nunca, a dar o meu melhor. Não porque aquele provavelmente seria o último show da banda, mas porque havia alguém especial na platéia, cujos olhos de ônix estavam voltados somente pra mim.


Se alguém, algum dia tivesse feito a previsão da minha vida hoje, eu jamais acreditaria. Mas se eu voltasse no tempo, consciente, eu esperaria 20 anos novamente para encontrá-la.


Fim