sábado, 1 de janeiro de 2011

Incidentes de Percurso

As coisas pareciam estar entrando nos eixos. Júlia voltou para suas viagens mundo afora com a Ana. Hélio acompanhava sempre que podia. Sinceramente eu não sei como ele consegue.
Apesar de babá, Gabriel me parecia bem “adaptado” com sua nova amiga de faculdade. Em compensação, fiquei sabendo que Flora não gostou nem um pouco. A república talvez fosse pequena demais para duas ruivas.


Thales criou mesmo uma rotina de corrida e confesso que estava cada vez mais difícil superá-lo. Mas eu não entregaria os pontos tão facilmente.


Ele e Alanis pareciam estar cada vez mais entrosados. E nós quatro passamos a fazer muitos programas juntos como cinema, teatro ou apenas sair para jantar.


Meus amigos, de uma maneira geral, se não haviam aceitado, tinham se acostumado a me ver acompanhado de Aretha. Oficialmente estávamos juntos e não atraíamos mais tantos paparazzi.


Ela tinha a agenda muito ocupada, e a minha ainda era um tanto ociosa. Então volta e meia eu ia buscá-la na faculdade para almoçar ou dar um passeio. Era engraçado observar as reações. As meninas cochichavam. Os garotos normalmente faziam careta, provavelmente tentando entender o que uma menina tão linda como ela via num coroa como eu.


Apesar da aparente tranquilidade, eu ainda estava atormentado pelo abismo existente entre nós dois e os pais dela. Ao mesmo tempo não queria atropelar as coisas nem forçá-los a minha presença.


– Vamos fazer uma viagem com a turma de biologia. – Ela disse uma noite na minha casa, franzindo o nariz.
– Que legal, Aretha! – Achei que era meu papel apoiar.


– Legal por quê? Não entendo o que os hábitos dos cavalos marinhos vão ajudar na minha formação acadêmica!
– Você sabia que são os machos do cavalo-marinho que geram os filhotes? São eles que ficam “grávidos”?


– Na verdade eles só guardam os ovos, J!
– É uma forma menos romântica de se ver...


– Tem razão... Desculpa. Fiquei irritada.
– Com o quê?


Seu olhar turvou.
– Vou passar uma semana fora, Jack! Longe de você!
– E qual é o problema? Ninguém morre por causa de uma semana... – Não que eu quisesse. Mas continuei no meu papel de “adulto maduro” da relação.


Ela de repente pareceu ter uma idéia mirabolante. Tomou fôlego, antes de disparar:
– Poxa! Você podia ir, que tal? Não é longe... Você pode ficar numa pousada perto do albergue da gente...  – Aretha engatou a segunda marcha e falava sem parar. – Quem sabe eu até consiga dar uma escapulida e dormir com você! Você vai, não vai?
– Sem chances, Anjo!


– Mas por queeeeeeeeeê?! – Embirrou.
– Porque é ridículo! É uma viagem de pesquisa de campo, você vai estar ocupada o dia inteiro! E nem de longe acho uma boa idéia você sair sorrateiramente do albergue. Além do mais, a galera sempre arruma uns programas bem legais à noite pra se fazer. Você vai se divertir...


– Eu me divertiria muito mais com você lá... E tenho certeza que ia fazer você ia se divertir também... – Ela abusou de malícia para se expressar.
– Não vou cair nessa, Aretha!


– Você se cansou de mim? – Perguntou de forma quase infantil.
– Você sabe que não, Anjo! Não faça chantagem emocional! Só estou te dizendo... Aproveite a vida de solteira....


Eu a abracei antes de continuar:
– Porque eu não pretendo te deixar dando sopa muito tempo...
– Bobo!


Nós sempre devemos medir nossas palavras. Eu não medi as minhas. Alguns podem achar superstição, mas a frase “te deixar dando sopa” acabou se mostrando muito mais real do que a brincadeira que quis fazer.


Aretha viajaria com a turma de biologia. Ela pediu e eu fui me despedir. Me beijou sob os olhares bisbilhoteiros de seus colegas. Alguns possivelmente com valores bem mais conservadores que os meus, embora eu tenha idade para ser pai de qualquer um deles.


Algumas e alguns olhavam com inveja, posso seguramente afirmar. E outros apenas com curiosidade. Estes talvez, fossem amigos mais chegados. Eu estava desconfortável.


Aretha foi a última a entrar no ônibus. A porta se fechou e ele partiu.


Mas acontece que antes que se completassem os dias planejados, eu acabei por receber um torpedo de celular. Não era de número conhecido, o que me deixou ainda mais nervoso.


A mensagem dizia que Aretha estava voltando para SimCity e continha um endereço onde eu devia encontrá-la. Mas eu reconheci imediatamente logradouro e número, porque era do mesmo hospital onde Gabe nasceu.


Nunca dirigi tão louca e perigosamente na minha vida. Cheguei no hospital em menos de 20 minutos. Entrei procurando por Aretha, mas mal conseguia formular uma frase entendível.
– Calma! O Senhor está muito nervoso! Quer um copo d’água? – perguntou a recepcionista frente ao meu estado alterado.


Respirei fundo.
– Não! Só quero saber sobre Aretha Roberts Webber. Ela está neste hospital?
– Eu vou verificar... Por que não se senta um instante?


Não respondi e não me sentei. De onde estas pessoas tiram tanta calma? Eu estava a ponto de sair procurando por meus próprios meios, nem que fosse abrindo cada porta do local. A recepcionista procurava informações no computador.
– Pode ser mais rápida, por favor? – Pedi educadamente à funcionária, embora quisesse esganá-la pela lerdeza.


– Pronto, está aqui: Aretha R. Webber. Na emergência, mas já deve estar terminando... O senhor pode aguardar.
– Eu não quero aguardar, eu quero vê-la! Agora!


A mulher perdeu a paciência comigo.
– Bem, senhor, isto aqui é um hospital. Não a gerência da sua barbearia!
– Desculpe. – Retomei minha razão. – Estou tenso, não sei o que aconteceu. Apenas recebi um recado...


– Acalme-se. Pela ficha foi um pequeno acidente. Sutura e imobilização, apenas. E já devem estar terminando a esta altura.
– Está bem... Acho que vou aceitar aquela água.


Eu esperei impaciente após beber meio copo de água gelada. A outra metade escorreu pelos cantos da minha boca enquanto eu virava o copo praticamente na minha cara.


Pouco tempo depois, como a recepcionista mencionou, Aretha apontou no corredor. O braço esquerdo engessado, o semblante derrotado, o resto parecia estar no lugar.


Levantei e fui ao seu encontro, e abracei com cuidado, como se ela fosse quebrável ou algo assim.
– Você está bem? O que foi que aconteceu? Como você se machucou? Como foi que voltou? Porque não tem ninguém acompanhando você? – Eram muitas perguntas.
– Agora estou. Foi um pequeno – ela vacilou antes de completar – acidente.


– Vai me contar? – Pelo seu tom, desconfiei que tinha algo errado ali.
– Eu quebrei minha mão na cara de um garoto... – Ela respondeu envergonhada.


– O quê?!
– A culpa foi dele! – Ela apressou-se em justificar. – Eu te disse que não queria ir nessa viagem estúpida!


– Ah, tudo bem! Você não queria viajar, então quebrou o nariz de alguém?! Tá certo! É justo... – Ironizei.
– A única coisa que quebrou foi minha mão, infelizmente... E os óculos do imbecil, mas eu que tomei os pontos por causa disso. – O nariz dela franziu, mas eu estava muito aborrecido para curtir.


– Que sorte do rapaz!
– Pare com o sarcasmo, Jack, você não sabe o que aconteceu!


– Claro que não sei, você não me contou!
– O Rodrigo, mas você também pode chamar de babaca, ele... – Ela fez uma pausa. Parecia não querer continuar. – Bem, ele agiu como babaca mesmo. Mereceu.


– Ah, fui muito esclarecedor! Agora sei que você teve toda a razão.
– Pára, Jack! Mas que droga! Porque quer saber os detalhes de tudo? Porque não pode simplesmente acreditar que o estúpido mereceu um murro?


– Aretha... Porque está sozinha? Porque me chamou aqui ao invés da Tara e do Mark?
– O monitor veio comigo... Ele que passou a mensagem de celular pra você. Eu só disse que ele não precisava ficar, que você já estava chegando.


– Venha... Vou levar você pra casa dos seus pais.
– Ah, não! Eu prefiro ir pra sua ou pra minha, no Campus.

Eu compreendi, então.


– Foi por isso que você me chamou, não é? Porque você sabe que é mais fácil me dobrar... Eu não sei o que você tá escondendo, mas se você não vai mesmo me contar, pelo menos pra sua mãe você vai! Eu vou levar você pra lá.
– Mas que droga, J! Eu sou maior de idade! Não foi por isso que te chamei. Foi por que confio em você.


– Confia tanto que não quer nem me dizer o que aconteceu!
– Porque você não vai gostar de ouvir...


– Provavelmente não, mas isso não faz diferença alguma.
– Tem certeza?


– Absoluta. – Fiquei firme
– A história inteira? Desde o começo? – Ela estava enrolando, eu sei.


– Temos tempo...

O rosto dela se torceu numa careta. Eu estava irredutível. Ela sabia que eu não deixaria passar desta vez.


Depois de dar um breve suspiro, Aretha começou:
“Esse insuportável... O tal Rodrigo... Ele... Errr... – Visivelmente, ela estava tendo dificuldades para contar. Eu não pressionei. – Bem, ele vivia se insinuando... Desde que entrei na UNESim... Mas eu nunca dei bola. Ele nunca me atraiu, mesmo que eu não tivesse ainda triste com toda aquela história do fim do meu namoro com o Gabe.”


“Mas depois daquela matéria de Paris... Ele meio que... As investidas deles ficaram mais agressivas... Mesmo eu dizendo pra ele parar, que eu tinha namorado e que eu não estava a fim. Eu não dei muita atenção... O que ele poderia fazer? Aí, alguns dias antes da gente viajar, ele tentou me beijar a força. Eu me soltei e disse que ele tinha passado dos limites e pra ele nunca mais falar comigo.”


“Ele não falou mesmo e eu achei ótimo! Só que... Hoje à noite... Eu fui até a praia... Queria ver os diabos das algas que o professor encheu o saco de tanto falar! Ele surgiu do nada! Me agarrou e de novo tentou me beijar. Eu me debati, mas dessa vez a gente tava sozinho, ele usou mais força. Eu ameacei gritar.”


“Ele me soltou para virar a mão aberta na minha cara e me chamou de vagabunda.”


Senti um ódio e uma repulsa tão grande! Um desejo incontrolável de esmurrar a cara do infeliz até deixá-lo desfigurado. Para sorte dele, eu estava distante. Ela completou:
– Eu aproveitei que ele me soltou, fechei o punho no nariz dele e saí correndo, enquanto ele caía de joelhos no chão e me xingava de nomes ainda mais horríveis...


– Cretino! – Praguejei. – Eu vou acabar com a raça desse filho...
– Não, você não vai não... – Ela me interrompeu. – Era um dos motivos porque eu não queria contar... Nem pra você, nem pro papai... E nem pensar do Thales saber disso! De mais a mais... Sei que ele não é o único que pensa isso de mim...


– Como assim? Por que acha isso?
– Eu vejo as pessoas cochicharem Jack... Sei o que falam nas minhas costas... Que eu “andava” com o filho, e que agora “ando” com o pai! Já ouvi baixarias do tipo: “ela deve até dividir o amante com a própria mãe...” As pessoas gostam de falar! Fazer o quê?


Lembrei de como algumas pessoas podem ser cruéis. Conheci figuras assim lá também. A própria mãe do meu filho e o insuportável engomadinho do ex-namorado de Tara, o Jayme.


– Aretha, você precisa fazer queixa dele à Reitoria.
– Efetivamente ele não fez nada. Nem cometeu nenhum crime. De qualquer maneira, o monitor e o professor já sabem o que aconteceu... É provável que eu não tenha mais problemas com ele.


– Tá. Tudo bem! Eu até entendo que não queira se expor, nem contar ao Thales, porque acho que ele ia querer matar o desgraçado, como eu... Mas você não pode esconder isso da Tara e do Mark.
– Ah, não... Não vem dar uma de pai pra cima de mim...


– Não estou “dando” uma de pai, Anjo! Eu SOU pai! Estou me colocando no lugar deles... Se fosse com a Júlia, eu ia querer saber!
– E também ia querer arrebentar o babaca! E também ia querer dar queixa! Sei como é que é...


– Converse com eles, Aretha... Conheço seus pais, eles vão te entender...
– É... Vão... Tanto quanto entenderam sobre nós dois!


Mesmo contrariada, Aretha acabou aceitando que a levasse pra casa de seus pais. Ela podia ser cabeça dura, mas sempre estava disposta a me escutar. Tinha consciência da minha experiência de vida e respeitava muito isso. Definitivamente, não me via como figura paterna e isso era um alívio.


Estacionei o carro na frente da mansão Webber.
– Vou te levar na porta.
– Não precisa. Já dei minha palavra que vou dizer a verdade.


– Não estou duvidando de você. Apenas quero te entregar na mão dos seus pais. Não estou querendo afrontar ninguém, mas peguei você machucada em um hospital. Não posso te largar assim! Não é correto, por mais que eles me odeiem.
– Eles não te odeiam. Vem... Vamos lá, então... – Ela me encorajou a sair do carro.


– Eu tenho a chave. – Disse Aretha ao notar que eu me inclinava na direção da campainha.
– Eu não vou entrar, Anjo. Ainda mais sem ser convidado. – Apertei o botão.


Tivemos que esperar alguns minutos. Pela hora, com certeza estariam dormindo. Não deu outra. Pelo vidro vimos um Mark de pijamas descendo as escadas, ainda com a expressão confusa. Ele parou em frente à porta nos olhando um tanto receoso. Acredito que brigava internamente achando se tratar de um sonho. Ou pesadelo.


Ele abriu a porta e tentou arregalar os olhos na esperança de acordar, eu acho. Ou talvez a idade já estivesse afetando a sua visão. Ok, isso foi ridículo. Ele é mais novo que eu. Um ano apenas, mas é.


– Aretha! – Ele exclamou assim que percebeu o gesso em sua mão. – O que foi que aconteceu?

Eu esperei que ele virasse automaticamente em minha direção com um olhar inquiridor, me imputando a culpa pelo que quer que tivesse acontecido a sua filha.


Mas isso não aconteceu. Ele apenas a abraçou com afeto e preocupação. E esperou que ela respondesse.
– Podemos entrar, pai? Está frio aqui fora...
– Mas é claro!


Eu não ia entrar. Meu intuito não era ficar ali, apenas deixá-la segura com seus pais. Devo admitir que também não me faria nem um bem ouvir aquela história de novo, menos ainda com Mark observando minha reação.
– Eu já vou, Anjo. Você está bem?
– Estou, J. Obrigada... Por tudo.


– Não foi nada. Se cuida.
Ela me deu um leve beijo. Eu não conseguia parar de pensar no pai dela ali parado observando cada gesto meu. Mesmo assim, nem de longe parecia aquele Mark que imaginei quebrando o meu nariz há coisa de alguns meses.


– Desculpa todo esse transtorno... Eu prometo me comportar melhor...
– Tá tudo bem, Aretha... Entra, vai. Está muito frio.


Aretha entrou, mas Mark ficou. Eu não sabia o motivo, e não tinha o que falar. Então apenas acenei com a cabeça e virei para descer as escadas da varanda.
– Jack! – Ele chamou, e eu parei.


– Eu não faço a menor idéia do que possa ter acontecido mas... Obrigado por trazê-la para mim.
Novamente eu não tinha palavras. Acenei com a mão. Não foi nada. Não tinha dúvidas de que ele faria a mesma coisa em meu lugar.



4 comentários:

  1. Okey... Tinha muito o que falar. Mas ver o Marklindo e gostoso sem camisa foi demais para mim! Uauuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuu

    AMO!!!!
    bjosmil! *.*

    ResponderExcluir
  2. Eu te entendooooooooooooooooooo!

    Haushauhsuasha!

    bjks!

    ResponderExcluir
  3. Mark? Jura q ele apareceu? nem vi... auhsuahsuhaushuah
    Eu tbm bateria naquele cara!!! idiota u.u'

    Jack eu te amooooooooooo!!! S2

    [momento histeria off] =P

    ResponderExcluir
  4. Hahsuahsuahsuahsua! Com esse grito acho mesmo que ele ouviu... XP

    Não viu porque é cega, eu sempre digo isso e vc não acredita! u_u

    bjks

    ResponderExcluir