terça-feira, 9 de novembro de 2010

Soltando as amarras

Não demorou pra ele me explicar. Na semana seguinte a notícia de que ele estava partindo para estudar no exterior caiu como uma bomba no meu colo, projetando meu coração pra fora da órbita terrestre.
– Você pirou? – perguntei incrédulo.
– Pirei por quê? Não posso estudar fora? Qual é o problema? Falta de dinheiro é que não é!


– Não, Gabriel... É que... – Eu vacilei por segundos para responder. A verdade é que o motivo pelo qual eu não gostaria que ele fosse era totalmente egoísta. Eu não queria que ele me deixasse só. – Porque tão de repente assim?
– Pai... – Ele amenizou o tom. – Eu preciso desse tempo. Pai, eu nunca fiz nada fora da sua supervisão... Eu... Às vezes me sinto tão... Tolo, tão infantil... Eu quero ser um pouco responsável por mim mesmo.


Eu não tinha argumentos contra isso, mas não queria deixar meu filho partir.
– Mas... A gente pode ver uma casa pra você morar, Gabe... Se é porque quer independência, nós podemos ver outra solução.
– Ta vendo, pai? Não é “nós”. Eu não quero independência de “carteirinha”, eu quero aprender a me virar sozinho.


Aquilo parecia um chute no estômago. Embora soubesse que ele precisava disso, no fundo eu tinha certeza que os motivos de sua viagem iam muito além. Gabriel estava fugindo.
– Pra onde você vai?
– Pra França.


– Porque a França?
– Porque não a França? – Ele retrucou.

É. Porque não?


– Quando você vai?
– Parto em dois dias.


– Dois? Dois! Não pode! Temos que tirar passaporte, fazer compras, ver onde vai ficar, ajeitar tudo, comprar as passagens...
– Pai! – Gabe interrompeu minha histeria momentânea. – Que parte do “eu quero me virar sozinho” você não entendeu? Eu já providenciei o necessário, pode se acalmar.


– Gabe... Quanto tempo pretende ficar fora?
– Eu não sei, pai... O suficiente. O curso que vou fazer dura seis meses. Mas tem outro que também tenho interesse... Então, depende, não sei...

O que ele queria dizer com suficiente? Eu não vou aguentar. Como me tornei tão dependente da presença de meu filho?


Ele pareceu ouvir meus pensamentos.
– Não é para sempre, pai... E você pode me visitar. Não é muito perto, eu sei, mas tempo não te falta, não é mesmo?

Gabriel estava certo e novamente eu não tinha mais argumentos racionais.


Dois dias depois estávamos nos despedindo no aeroporto. Alanis veio com Marley. Victória com seu marido, Sandro. Hélio levou Júlia, que conseguiu uma folga para se despedir do irmão.
– A Ana vai gravar em Lyon em outubro, Gabe! A gente se vê!
– Que ótimo, Júlia! – Gabriel não parecia entusiasmado.


Alanis abraçou Gabriel com força.
– Vou sentir saudades... Vê se entra no MSN de vez em quando, cabeçudo!
– Vou pensar no seu caso... – Brincou. Pelo menos algum humor ele ainda tinha.


Depois foi a vez do aperto de mão de seu padrinho.
– Vai na fé, brother... Lyon é linda! Já tocamos lá. Você vai gostar.
– Tenho certeza, Marley!


As despedidas continuaram com Gabe se abraçando a mãe e o padrasto. Victória estava muito emocionada. Mal conseguia falar.
– Gabe, promete que vai dar notícias?
– Prometo, mãe... Sandro, cuida dela pra mim!


Na hora de abraçar meu filho tive medo de não conseguir conter as lágrimas. Nunca ficamos tanto tempo afastados, embora isso viesse acontecendo gradativamente. Agora seriam seis meses... Talvez mais. Não queria pensar nisso.
– Boa viagem, meu filho... Liga assim que pousar.
– Ok, pai, mas não me envergonha!


Gabriel virou pra embarcar, mas estacou ao ouvir gritarem seu nome.


Nós viramos e vimos Aretha correndo em sua direção.
– Espera! Gabe!

Claro que ele esperou.


Ela se aproximou, e ninguém sabia o que falar ou o que fazer.
– Você ia embora sem se despedir de mim? – A voz composta por uma mágoa profunda.
– Achei que tivesse chateada comigo.


– Ainda dói. Mas não não quero perder sua amizade, Gabriel. – E o abraçou. Aretha tinha o dom de sempre me surpreender de alguma forma.
– É claro que você não vai perder minha amizade, Aretha... Nunca...


– Mas não vou te perdoar por perder meu aniversário! – Ela fez aquele seu bico de novo. – Não podia deixar pra ir depois?
– Desculpe, meu curso começa essa semana


– Vai perder uma festa e tanto!
– Eu prometo que te ligo pra te dar parabéns.

E com um leve beijo em seu rosto, Gabriel se despediu.



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